quarta-feira, 19 de novembro de 2008

Uma Plausível Razão da Campanha Midiática Acerca do Desmatamento na Amazônia

Espaço Povos da Floresta

Image by swperman via Flickr




Há alguns meses, iniciou-se uma campanha nacional, por parte da grande mídia, de evidenciação do problema do desmatamento acelerado na Amazônia. Só um louco para negar o desmate e a intensidade com que ele vem sendo feito. Aliás, há décadas que isso vem ocorrendo e isso é bem sabido. O ponto que quero levantar aqui diz respeito à motivação de tal campanha midiática ter surgido tão de repente (e que  provavelmtente será desfeita na mesma velocidade).


É perceptível que as pessoas no Brasil vêm absorvendo no seu discurso diário assuntos relacionados a preocupação com o meio ambiente. Mas, tal tema está extremamente distante das maiores preocupações diárias das pessoas. De fato, o comportamento cotidiano da maioria de nós é extremamente conflitante com com nossas ralas preocupações periféricas acerca do uso racional e sustentável do meio ambiente. Seria estranho, pensando assim, que houvesse por meses, diariamente, notícias sobre o problema do desmatamento amazônico simplesmente por ser este um tema de suma importância segundo a consideração pessoal de boa parte da população. O que as pessoas mais querem ver, além de bagaceirices gerais, é da inflação, tragédias pessoais, do trânsito, etc. A amazônia é tão estranha para e distante da vida cotidiana da maioria da população brasileira (que é costeira ou virada para a costa) que qualquer mito barato que se inventar sobre ela na tv será acreditado por esse povo. Ela está em pé de igualdade com a guerra no Iraque: é o tipo de assunto que pode ser usado para diversos fins com o intúito de se justificar qualquer posicionamento político para, logo depois, ser abandonado. Isso se dá por esses temas serem de pouco conhecimento geral e moverem as "paixões" de maneira relativamente fácil. O problema do desmatamento amazônico ainda não é, para nós brasileiros, um grande problema moral a ser resolvido, mas uma campanha midiática de meses foi feita em cima desse assunto. Estranho, não?


Agora, vamos ver o que é que realmente foi visado por essa campanha. Já adiantando a minha conclusão, é plausível pensar que o que a motivou foi a tentativa de enfraquecer politicamente duas forças políticas novas crescentes: uma, iconificada em Marina Silva, a outra, em Blairo Maggi.


Primeiro, a Marina Silva. Quem era ela antes da campanha contra o desmatamento? Tão folclórica para a grande mídia (e isso provavelmente refletia a visão majoritária do senso comum do Brasil "costeiro") quanto ainda é o Gilberto Gil. Era, contudo, também vista como a herdeira de Chico Mendes, um daqueles personagens que se tornam "do bem" para o stablishment justamente porque morreram logo. Era também conhecida por ser pobre e ter "vencido" na vida e isso gerava a idéia de honestidade e trabalho. Era uma espécie de "Lula" do Acre-Amazônia. Depois da campanha de difamação destilada da sua pessoa, quem se tornou Marina Silva para o "ideário coletivo" proposto pelos grandes meios de comunicação? Uma moça frágil, ingênua e incapaz de resolver os problemas típicos do seu cargo de ministra. Chegava a dar pena daquela moça, ela era tão bem intencionada... Mas, o que nunca se disse (o que não é de se impressionar) é que Marina, por boa parte de sua vida, vem tentando tocar um projeto social muito amplo e rico, que vai muito além do "deixar as arvrinhas em pé". Sua meta (digo, do moviento social do qual era uma representante) era mudar completamente uma estrutura econômica predatória e, o que vem sendo mostrado ao longo dos anos, incompatível com a existência da floresta amazônica no seu esplendor descomunal. E isso envolve, certamente, uma reforma completa nas sociedades amazônicas, na sua estrutura econômica, fundiária, de conhecimento científico, etc. Seu projeto iria tentar realizar mudanças que o governo Lula jamais consiguirá realizar. Caiu com a Marina Silva um projeto ímpar no mundo e foi esse projeto um dos alvos da campanha "contra o desmatamento" na Amazônia, realizada ao longo de meses a fio, metodicamente.


Vamos, agora, ao Blairo Maggi. Ele é uma figura oposta a da Marina: monocultor latifundiário, depredador, com o capitalistmo na veia. Mas, isso é o que sempre foi, sua origem é essa. É o maior ícone do que chama Viveiros de Castro de modelo gaúcho. (A Amazônia, para esse modelo, é tão mato quanto é o Cerrado, que é mato oficial (essa é a maior evidência de que a preocupação coletiva com a Amazônia é só fetiche, e quem conhece o Cerrado concordaria)). Sobretudo, ele era conhecido, ainda que relativamente pouco famoso, por ser um homem bem-sucedido no mundo dos negócios e com, portanto, boa capacidade administrativa. As características negativas acima, em si mesmas, não são preocupantes para a maioria da população. Blairo seria eleito presidente do Brasil do mesmo modo que se tornou governador de Mato Grosso, mesmo sendo desmatador, etc. Essa era a principal imagem que sempre se passou dele. Que ele era destruidor da floresta, todos sabiam, mas conhecimento que estava no degrau adequado às reais preocupações da maioria da população: bem baixo. Mas, e depois da campanha demonizadora da sua figura e caráter "ambiental"? Se tornou, pela vinculação da grande mídia, talvez o que mais foi: destruidor desmesurado da tão amada Amazônia, bull dog irracional levado pela sede de poder econômico, etc. Foi feito com ele o que o Serra fez com o Ciro na campanha de 2002, quando o mostrou gritando e ofendendo uma pessoa num programa de rádio. "Blairo Maggi não é capaz de governar a si próprio". É a compreensão dessa virada do discurso que revelaria os reais interesses da campanha pela amazônia.


Eu compreendo da seguinte maneira. Blairo é o representante de uma das maiores elites econômicas atuais no Brasil. Elite nova, bem brasileira, do interior do brasil, que não conhece bem a costa e não faz questão de ir à São Paulo, centro do capitalismo brasileiro, que cresceu à margem de SP (cujo poder econômico quase que impera sobre o resto do país), e é um dos maiores responsáveis pelas exportações nacionais. Ora, é aí que começa o problema. Blairo é a maior força política de um estado politicamente pequeno, porém o poder econômico do seu grupo pode e vem se lançando por boa parte do território nacional. Ele seria uma grande figura de interlocução de diversas forças regionais para fazer frente ao poder hegemônico de São Paulo. Seria bom para, por exemplo, Bahia, Rio Grande do Sul ou Minas, impulsionar uma figura dessas. Já é de algum tempo que se cogita colocá-lo como candidato à vice em uma chapa petista ou aliada. A idéia  pode parecer até ridícula agora, mas, caso se concretizasse, simbolizaria uma enorme mudança do eixo político brasileiro, cujo maior perdedor seria São Paulo, mas precisamente, os interesses amalgamados no PSDB de Serra. Após a campanha midiática de longos meses de difamação da figura de Maggi, todo um projeto de reestruturação das forças políticas nacionais, considerado de centro-esquerda, ficou prejudicado no aspecto "figura política viável nacionalmente".


Interessante notar que a queda de Marina Silva não só é compatível com o crescimento do modelo econômico de Maggi, mas é também benéfica ao seu crescimento. Prova das contradições do governo Lula.


Para mim, a compreensão da campanha midiática em questão deve passar por uma análise de fundo das forças político-econômicas em conflito atualmente visando as eleições de 2010. O tema ambiental sempre foi periférico e ainda será por algum tempo no Brasil para que uma campanha de tal magnitude fosse levada à cabo pelos grandes veículos de comunicação de massa brasileiros, cujos principais donos proprietários são, hoje, membros, amigos ou aliados da mais forte e organizada contra-corrente político-econômica das mudanças sociais em curso no Brasil: o PSDB paulista.



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